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O Braço do Senhor

por T. Austin-Sparks

Capítulo 7 - Restauração do testemunho perdido

À medida que avançamos para os capítulos seguintes de Isaías - assumindo o lado positivo da ressurreição, o lado construtivo da Cruz - descobrimos um fato que é muito visível: a saber, a restauração do testemunho de Deus na cidade e nas nações. Essa é a chave para esta seção de Isaías do capítulo 54 em diante. Perceba que Sião está muito à vista aqui. Se lermos o texto e circularmos as palavras “Sião” e “Jerusalém”, veremos a ênfase, o ponto focal do testemunho. No entanto, também vemos muito destaque para as nações. Isso ficará mais claro à medida que prosseguirmos.

Chegamos, então, primeiro ao capítulo 55, e notamos duas coisas que marcam este capítulo.

Graça abundante e a Palavra Segura de Deus

Nos versículos 1-9, vemos a gratuidade e a abundância da graça liberada para o povo de Deus nesta base da ressurreição – graça gratuita e abundante. “Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e vós, os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite….” Quanto do Novo Testamento poderia estar incluído nisso!

Então, do versículo 10 ao versículo 13, temos a palavra segura de Deus: “A minha palavra... não voltará para mim vazia” . Hoje em dia, costumamos reivindicar essa promessa do Senhor quando vamos dar uma mensagem, de que Sua palavra não voltará para Ele vazia. É claro que esse princípio tem uma aplicação geral; não erramos ao nos apegarmos a isso, desde que seja realmente a palavra do Senhor que vamos transmitir.

Mas desejo salientar que esse não é o significado específico da afirmação aqui. Você notará a sequência nos versículos 11 e 12: “assim será a palavra que sair da minha boca: não voltará para mim vazia, mas fará o que me apraz e prosperará naquilo para que a designei. PORQUE ..." (você não deve parar por aí) - “PORQUE, com alegria, saireis e, em paz, sereis guiados; os montes e os outeiros..." [Is 55”12 ARC], e assim por diante. O significado imediato da promessa da palavra segura e eficaz é: Este povo recebeu a promessa de libertação de Deus; tiveram a certeza de que o Senhor os traria de volta do cativeiro. (Compare com Is.35:10; 48:20; 52:12). Ele havia dado Sua palavra de que deveriam sair com alegria e em paz, nessas condições. Essa era a palavra, e essa palavra não iria falhar.

A Casa de Oração e a Necessidade de Mansidão

Quando você chega ao capítulo 56, descobre que tudo está centrado na Casa de Oração para todos os povos. “Também os levarei ao meu santo monte e os alegrarei na minha Casa de Oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu altar, porque a minha casa será chamada Casa de Oração para todos os povos.” (vs 7). Isto ainda está relacionado com a restauração do testemunho do Senhor, e pode ser encontrado em Sua Casa - 'Minha casa de oração'.

No capítulo 57, encontramos mais algumas advertências ao povo do Senhor contra qualquer recorrência daquilo que havia destruído o testemunho anterior. Parece sempre necessário que o Senhor diga, e repita: Tenha cuidado com o retorno daquelas coisas antigas que destruíram o seu testemunho no passado; as coisas que (usando a frase de Jeremias da casa do oleiro) “estragaram” o vaso do testemunho. (Veja Jr 18:4) Portanto, Ele nos traz aqui uma advertência a respeito desses constantes perigos.

Então, no versículo 15, a base da presença e comprometimento do Senhor é mencionada. “Porque assim diz o Alto, o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no alto e santo lugar, mas habito também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos e vivificar o coração dos contritos”.  Estas são as condições da presença do Senhor, aquelas nas quais o Seu testemunho será reconstituído.

Os capítulos 58 e 59 estão cheios de advertências, admoestações, instruções, a fim de limpar o céu das nuvens que obscureciam o testemunho. Observe o capítulo 58, versículo 8: “Então, romperá a tua luz como a alva...”  É o brilho deste testemunho que está governando tudo com o Senhor. Esses avisos e advertências são dados a fim de provocar a remoção das nuvens que permanecem no céu e tentam obscurecer esse claro resplendor.

Um Testemunho Claro e Brilhante Restaurado

Somos assim conduzidos ao capítulo 60. Tudo o que aconteceu antes preparou o caminho, sempre com isto em vista: "Dispõe-te, resplandece, porque vem a tua luz, e a glória do SENHOR nasce sobre ti." Aqui chegamos a esta questão do testemunho restaurado; a luz brilhante da Igreja no meio de condições sombrias, num mundo que está em trevas. "Porque eis que as trevas cobrem a terra, e a escuridão, os povos; mas sobre ti aparece resplendente o SENHOR, e a sua glória se vê sobre ti." Isso é o que predomina nesta última seção das profecias de Isaías. Quando o testemunho é restaurado (vs 1) isso gera um efeito nas nações: “Levanta em redor os olhos e vê; todos estes se ajuntam e vêm ter contigo; teus filhos chegam de longe, e tuas filhas são trazidas nos braços. Então, o verás e serás radiante de alegria; o teu coração estremecerá e se dilatará de júbilo, porque a abundância do mar se tornará a ti, e as riquezas das nações virão a ter contigo" (vs 4,5).

Quando o testemunho é claro e o seu brilho não é ofuscado e quando Deus tem na Sua Casa, no Seu povo, condições que respondem a tudo o que a Cruz significa, então você encontra esse efeito ao redor: as nações são afetadas, os povos são tocados; algo acontece, e um enriquecimento e plenitude voltam para a própria Igreja. Se o Senhor tem as coisas de acordo com Seu propósito: ou seja, se Ele realmente tem o Seu testemunho em plenitude, sem nuvens nem sombras, no meio do Seu povo, no vaso da Sua Casa: então as nações sentem esse efeito, o impacto disso, e a própria Igreja é grandemente enriquecida. “Certamente, as terras do mar me aguardarão; virão primeiro os navios de Társis para trazerem teus filhos de longe e, com eles, a sua prata e o seu ouro, para a santificação do nome do SENHOR, teu Deus, e do Santo de Israel, porque ele te glorificou." (vs 9).

A Contraparte do Novo Testamento

Sabemos que esta é a profecia do Antigo Testamento. Reconhecemos que o profeta estava dizendo mais do que sabia – que suas declarações continham e combinavam dois elementos entrelaçados. Por um lado, no que diz respeito a Israel, havia história em formação; mas por outro lado, durante todo o processo, houve (como vemos no capítulo 53) uma indicação para o Messias – o próprio Senhor; para a Cruz, e para todos os que seguiriam a Cruz na ressurreição. Temos o temporal e o passageiro, mas também o espiritual e o eterno, que o Espírito Santo sempre viu e teve em vista na história.

Assim, em todas essas conexões, como vimos, somos, por assim dizer, “encaminhados”, por essas profecias, ao Novo Testamento. E a contrapartida neo-testamentária daquilo que vimos em Isaías sobre o testemunho restaurado encontra-se particularmente numa das cartas de Paulo, nomeadamente na sua Segunda Carta aos Coríntios.

Segunda Carta de Paulo aos Coríntios

O grande tema de ambas as cartas aos Coríntios era o testemunho da Igreja na cidade de Corinto e no mundo. Quando lemos estas cartas, é claro que ficamos muito envolvidos com todos os detalhes: na Primeira Carta, com os detalhes infames; as muitas coisas que foram tratadas ali. Na maior parte das vezes, não é uma carta feliz ou agradável de ler: talvez você tenha desistido dela muitas vezes antes de chegar ao fim, não entendendo muito e nem gostando tanto assim de seu conteúdo. Mas precisamos dar um passo atrás e nos perguntar: Afinal, do que se trata tudo isso? Não vamos nos preocupar com todos os detalhes, por enquanto; todos eles vão se resumir num problema específico. Qual é o problema?

Pois bem, como já disse, a questão central das cartas aos Coríntios é o testemunho do Senhor na Igreja, na cidade e nas nações. Sejamos claros sobre isso. Na Primeira Carta, como vocês sabem, fala-se muito sobre o mundo e como a igreja em Corinto não estava conseguindo vencer o mundo, porque o mundo já a havia vencido a partir de dentro. O testemunho foi destruído por dentro e, portanto, não havia impacto real no mundo. O homem natural, o carnal, encontrou o seu caminho para dentro da igreja, e a igreja, portanto, perdeu o seu testemunho. Isso sempre vai acontecer dessa maneira. Se alguma coisa do homem natural e do homem carnal fizer incursões, em qualquer localidade, na igreja, esse será o fim do testemunho ali, no que compete o mundo. Quando o homem natural entra, o testemunho desaparece.

Testemunho Destruído por Elementos Carnais

Na Primeira Carta, então, toda a questão não era apenas uma questão de condições locais, mas de condições locais que destruíam o testemunho da Igreja na cidade. E, portanto, todas essas condições tiveram que ser enfrentadas, expostas, descobertas e levadas à Cruz de Cristo. É claro que o que temos em 1 Coríntios é a segunda grande estratégia de Satanás para paralisar o testemunho da Igreja. A sua primeira estratégia foi a perseguição aberta, para tentar destruir, obliterar o testemunho da Igreja na cidade de Jerusalém e na nação. Como sabemos, essa estratégia falhou! Mas agora Satanás regressa com uma segunda linha de estratégia: isto é, ele insinua, nas próprias fileiras da igreja, homens de acordo com a sua própria mente - usando elementos carnais - o homem natural, o homem carnal. Eles servem tão bem ao propósito do Diabo; eles efetuam exatamente o que o inimigo deseja. Quando ele descobre que não pode ter sucesso através da perseguição aberta, ele dá a volta, por assim dizer, pela entrada dos fundos e introduz elementos carnais e naturais por ali - e pronto! O testemunho é perdido; está destruído.

Mas entre essas duas cartas aos Coríntios algo aconteceu. No capítulo 7 da Segunda Carta lemos: “Agora, me alegro não porque fostes contristados, mas porque fostes contristados para arrependimento ... Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz pesar” (2Co 7:9,10) . O apóstolo tem muito a dizer sobre o que evidentemente aconteceu depois de sua primeira carta. Houve arrependimento; julgamento dos próprios corações e suas das condições; houve, como ele disse, “Que defesa, que indignação, que temor, que saudades, que zelo, que vindita!” (v. 11). Vemos uma verdadeira angústia e preocupação com a própria condição espiritual, e isso ocorreu entre as duas cartas. Podemos dizer que levaram a situação até à cruz e isso mudou tudo. E agora que as coisas tinham sido tratadas internamente, toda a questão do testemunho ao mundo, na cidade, poderia ser reconsiderada, e um contra-ataque poderia ser feito pela igreja contra o inimigo.

Então é isso que vemos nesta Segunda Carta – a restauração do testemunho na localidade e para o mundo. Tudo isso traz à tona de forma muito clara os constituintes do testemunho eficaz – ou, para usar a figura de Isaías, o resplendor da luz. Vejamos algumas das coisas que Paulo nos diz a esse respeito.

O Valor do Amor Triunfante

“Porque, no meio de muitos sofrimentos e angústias de coração, vos escrevi, com muitas lágrimas, não para que ficásseis entristecidos, mas para que conhecêsseis o amor que vos consagro em grande medida.” (2Co 2:4).

A primeira coisa que vemos é o valor do amor triunfante. Isso é um constituinte do testemunho eficaz, do resplendor. Isto claramente teve seus dois lados no Apóstolo. Se alguma vez um homem pudesse ter encontrado seu amor esgotado, isso poderia ter acontecido com o apóstolo, no que diz respeito aos coríntios; pois ele disse: "Se mais vos amo, serei menos amado?" (2Co 12:15). Certamente isso é suficiente para desanimar qualquer homem – descobrir que toda a sua manifestação e entrega de amor significa apenas que o amor está sendo drenado; que cada vez menos amor retorna.

Que situação ele teve que enfrentar! ainda assim, seu amor triunfou. Mas parece ter surtido efeito também neles: parece ter acontecido algo do que ele escreveu na sua Primeira Carta, no capítulo 13. Sim, o triunfo de 1 Coríntios 13 pode ser traçado nesta Segunda Carta em um grau muito real – o amor que “é paciente e é benigno”, e assim por diante – essa qualidade do amor triunfante.

Esse, poderíamos muito bem dizer, é o primeiro e principal fator para um testemunho eficaz. O Senhor Jesus disse que: “Nisto conhecerão todos... se vos amardes uns aos outros” (Jo 13:35). Este é o testemunho; é assim que será conhecido - se tivermos amor uns pelos outros. É muito importante que o mundo seja afetado pelo que vê. Não podemos fechar as portas para nós mesmos e dizer: 'Oh, bem, o mundo, de qualquer forma, é hostil e insensível; por que levá-los em consideração? Vamos nos fechar e continuar com nosso trabalho.’ Você não pode fazer isso; não pode ignorar o mundo. Estamos aqui para afetar o mundo – essa é uma das principais razões pelas quais o Senhor nos deixou aqui. Não devemos viver enclausurados e fechados, indiferentes ao mundo, friamente desligados dele.

Além disso, o mundo vai descobrir, mais cedo ou mais tarde, o que está acontecendo dentro da igreja – o que está acontecendo na sua assembleia local! Não se engane sobre isso. O mundo conhecerá a condição da igreja: você não pode fechar portas e janelas e manter as coisas ali dentro! Todos ao redor saberão; tudo se tornará conhecido. E repito: é muito importante que o mundo seja afetado, não pelo que nos ouve dizer, mas pelo que vê em nós.

E a única coisa que pode realmente ver, e que de fato irá afetá-lo, será o amor mútuo que temos uns pelos outros. "Nisto todos os homens saberão... se vos amardes uns aos outros." Uma das formas mais eficazes de testemunho é – não pregar, mas – amar ! Se isso existir, fará muito mais do que a nossa pregação. Bem, pelo menos dará um grande suporte à nossa pregação. Toda a nossa pregação deve ser apoiada por isso: um amor forte e triunfante no meio do povo do Senhor.

O Valor do Sofrimento com Cristo

A segunda coisa relacionada ao testemunho é o valor do sofrimento com Cristo. Temos muito sobre isso na Segunda Carta aos Coríntios. Por exemplo: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus. Porque, assim como os sofrimentos de Cristo se manifestam em grande medida a nosso favor, assim também a nossa consolação transborda por meio de Cristo. (2Co 1:3-5).

Em primeiro lugar, sofrer com Cristo traz um retorno maravilhoso na descoberta das consolações de Cristo.

É algo muito importante, num mundo como este, que tenhamos algum conforto para repartir. Tanto na Igreja como fora dela, existe uma grande necessidade de um ministério de conforto. Vamos voltar em Isaías: “Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus.” (Is 40:1). Mas você não pode cumprir um ministério de consolação com meras banalidades; se deparando com situações difíceis e problemáticas e apenas dizendo coisas agradáveis. Se as pessoas estão realmente em apuros, em verdadeira angústia, e você começa a falar com elas, a primeira coisa que elas têm o direito de lhe dizer é: 'Bem, o que você sabe sobre isso? Você já esteve na minha posição, na minha condição? você já teve algum sofrimento muito profundo? O que você sabe a esse respeito?’

Talvez, portanto, esse seja um desses caminhos soberanos e providenciais de Deus. Ele permite que Seu povo conheça muito sofrimento, para que possam derivar este valor maravilhoso das consolações de Cristo, e então possam ter algo com que confortar ou encorajar os outros - os provados, os sofredores, os abatidos. E o que temos para dar? Bem, a palavra é: “para podermos consolar... com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus”.

E se há alguém lendo estas linhas, que está passando por um momento doloroso e de sofrimento, passando por um “caminho escuro”, como costumamos dizer, posso tentar transfigurar isso para você, da seguinte forma. Olhe para a sua situação assim, diga a si mesmo: 'Isso me dá a oportunidade de fazer uma descoberta do Senhor que será essencial para o serviço futuro. Em minha angústia e dificuldade posso encontrar conforto e ajuda do Senhor, o que pode ser de um valor tremendo para outras pessoas no futuro.'

Ministério formado por meio da Experiência da Ressurreição

Pois é assim que o ministério é formado. O homem ou a mulher que ambiciona estar “no ministério” – falar e pregar, conduzir reuniões e todo esse tipo de coisa – mas que não passou por lugares profundos e encontrou o Senhor ali, e trouxe algum tesouro dessas profundezas, alguma 'pérola de grande valor': não tem um ministério real. Esse ministério é artificial, meramente profissional. O verdadeiro ministro de Jesus Cristo será levado às profundezas, para descobrir lá, bem lá no fundo, e de lá trazer essas pérolas, essas coisas preciosas, pelo bem da Igreja. Você notou aquela frase em Isaías “porque a abundância do mar se tornará a ti” (Is 60:5)? Sim, mas o mar pode ser um lugar muito profundo, um lugar muito escuro, um lugar muito terrível: e ainda assim encontramos tesouros ali. Esse é o caminho do testemunho.

Observe o que Paulo escreve no início de sua carta. “Porque não queremos, irmãos, que ignoreis a natureza da tribulação que nos sobreveio na Ásia, porquanto foi acima das nossas forças, a ponto de desesperarmos até da própria vida.” (2Co 1:8). É assim que o ministério é formado – quando você tem uma experiência real e um testemunho do poder da Sua ressurreição. Quando tudo parecia sem esperança em sua situação, no meio dos irmãos que você congrega; e a providência de Deus te conduziu a descobrir o poder da sua ressurreição, ‘para que não confies em ti mesmo, mas no Deus que ressuscita os mortos’ [vs 9]: esta é uma constituição de um ministério. Se você seguiu esse caminho, é um verdadeiro 'ministro'; não precisa levar o nome, nem ser separado, nem nada. Se você tem conhecimento do grande poder de Sua ressurreição, é um ministro; tem algo que é extremamente necessário.

O Valor do Quebrantamento

A terceira coisa no testemunho eficaz é o valor do quebrantamento e da fraqueza.

“Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal. De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida” (2Co 4:7-12).

Devemos continuar lendo até o versículo 18. Você notará que esta seção tem como mensagem real o tremendo valor da qualidade do quebrantamento e da fraqueza. Isso é algo vital no testemunho eficaz. Talvez nós, naturalmente, não damos muito valor ao quebrantamento e à fraqueza; mas aqui, muito valor é dado a isso. “Temos este tesouro em vasos de barro.” O que o Apóstolo está dizendo, com efeito, é isto: 'Somos homens quebrantados; somos vasos fracos. A única coisa sobre nós, que é de suprema importância, é a nossa capacidade de sermos quebrados – parece que fomos feitos para isso.’ E então ele diz que há um valor infinito associado a esse processo.

Na Primeira Carta aos Coríntios, a igreja não estava quebrada. Foi difícil; estava tentando manter-se intacta; estava orgulhoso; julgando; foi cruel; foi impiedosa; estava tudo menos quebrada. Mas agora, ao lermos esta Segunda Carta, descobrimos uma suavidade na igreja. Está macia - derretida - quebrada! Você pode falar sobre “ministério” agora; pode falar sobre 'testemunho'; você não poderia fazer isso antes. Não: até que o vaso se rompa, nada pode fluir; se algo tiver que fluir, isso só acontecerá a partir do momento que o vaso estiver quebrado. O apóstolo está dizendo que foi assim com ele pessoalmente (e é claro que ele está, por inferência, transmitindo isso à igreja em Corinto). Nossa fraqueza, nosso quebrantamento, é da extrema importância e valor, pois só então o verdadeiro tesouro poderá ser manifestado.

Você fala sobre 'o testemunho'? você adota essa fraseologia relacionada ao 'testemunho'? Você fala e tem ideias sobre 'ministério'? Meu querido amigo, o Espírito Santo diria para nós que o testemunho e o ministério só são reais quando vêm de homens e mulheres quebrantados. Não nos enganemos a esse respeito. Eu sei que é o caminho mais difícil, mas é o único. Nós não temos o direito de ministrar, nem direito de falar sobre 'o testemunho’, sobre 'a Igreja’, 'o vaso' ou qualquer coisa assim, a menos que saibamos algo sobre esse quebrantamento, essa fraqueza.

Perceba como isso é verdade em relação ao que lemos em Isaías. O Senhor diz: “A minha casa será chamada Casa de Oração para todos os povos” (Is 56:7); - “Porque assim diz o Alto, o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no alto e santo lugar, mas habito também com o contrito e abatido de espírito” (Is. 57:15). Você O encontra na humilhada e disciplinada Corinto. Há algo novo nesta segunda carta – algo que estava faltando na primeira. Você sente a unção do Espírito, a beleza do Senhor. Sim: o Senhor está aqui agora, porque eles estão quebrados. Essa unção do Senhor só é encontrada em homens e mulheres que realmente tiveram um enfraquecimento, uma quebra, um esvaziamento, que perderam toda a “confiança na carne”, cuja própria força se foi. Esse é o caminho do brilho; esse é o caminho do testemunho restaurado.

Amor, o Caminho do Alargamento

Há mais uma passagem que gostaria de mencionar.

"Para vós outros, ó coríntios, abrem-se os nossos lábios, e alarga-se o nosso coração. Não tendes limites em nós; mas estais limitados em vossos próprios afetos. Ora, como justa retribuição (falo-vos como a filhos), dilatai-vos também vós.” (2Co 6:11-13).

Qual foi a causa do testemunho perdido e destruído em Corinto? Eles eram muito estreitos; muito pequenos. Paulo disse que ele tinha que tratá-los como bebês – eles eram rabugentos! As crianças costumam ser assim, não é? Dão muita importância as ninharias. Paulo diz: 'Alargai-vos, ampliai-vos! Deixem seus corações serem ampliados! Sejam pessoas maiores – sejam tão grandes ao ponto de não se rebaixarem a essas coisas ruins. Tenham grandes pensamentos, sentimentos grandiosos - claro, sem presunção ou e se considerarem superiores; mas tenham um grande coração - um coração de amor!'

O que o amor faz? O amor “não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade”. O amor “tudo crê”: é preciso um grande coração para isso, não é? Nunca está pronto para acreditar num relatório desfavorável, mas está sempre pronto para acreditar que pode haver algo positivo - que pode haver outra explicação. O amor não se alegra quando alguém que cometeu um erro sofre as consequências por seu erro – isso é mesquinho.

É aqui que Davi é uma grande repreensão para nós. Basta pensar nele: que vida ele passou na mão de Saul durante aqueles anos! Ele o caçou, disse ele, como uma pulga, como uma perdiz (1Sm 24:14; 26:20); perseguiu-o de rocha em rocha, de caverna em caverna, no deserto, se ao menos ele pudesse pegá-lo e destruí-lo; não lhe deu paz nem de dia nem de noite. Ele estava implacavelmente determinado em tirar a vida de Davi. Então chegou o dia em que, numa dessas perseguições, Saul, com seus 3.000 homens escolhidos - um exército para capturar um homem! - chegou em determinado local à noite, e deitou-se para dormir. Sem que ele soubesse, Davi estava muito próximo, bem ali (acho que ele não teria dormido se soubesse!); e Davi veio com os seus homens e olhou para ele; e os homens de Davi disseram: 'Eis que te entrego nas mãos o teu inimigo, e far-lhe-ás o que bem te parecer.' (1Sm 24:4).

Se pudermos imaginar que temos o apoio Divino para alguma coisa, isso é tudo que desejamos. Queremos apenas que alguém diga: 'É a vontade do Senhor', e, se isso for algo que serve os nossos próprios interesses, algo que naturalmente nos agrada, prontamente o faremos! É uma tentação muito forte, não é, quando uma ação parece ser apoiada pelo Senhor?

Mas aqui, Davi – como em outra ocasião, quando seu companheiro disse: ‘Deus te entregou, hoje, nas mãos o teu inimigo; deixa-me, pois, agora, encravá-lo com a lança, ao chão, de um só golpe; não será preciso segundo.’ (1Sm 26:8) - Davi respondeu: 'Não, não; Deus me livre de tocar no ungido do Senhor!' Ah, isso é grandeza; verdadeira grandeza. Ele evitou isso, para sua própria dor. Davi não sabia quantos anos de sofrimento ainda teria pela frente, mas os aceitou. Ele poderia ter acabado com todo o seu sofrimento de uma só vez, mas disse: 'Não, não devo tocar no ungido do Senhor. Posso estar certo, e o ungido do Senhor pode estar completamente errado: no entanto, não cabe a mim tocar nele. Deixo-o com o Senhor; Não devo levantar minha mão contra ele. Deus me livre de tocar no ungido do Senhor.' Repito: isso é grandeza, isso é grandeza espiritual! E assim Paulo apela aos coríntios: "Ora, como justa retribuição (falo-vos como a filhos), dilatai-vos também vós.” O Senhor nos faça grandes pessoas, neste sentido espiritual.

O que Constitui o Testemunho Restaurado

Vamos agora tentar resumir o que constitui o testemunho restaurado, seja esse testemunho local ou mundial.

Esse testemunho deve nascer, em primeiro lugar, como vimos, daquilo que conhecemos do conforto divino por intermédio do sofrimento.

Em segundo lugar, ele é originado daquilo que conhecemos da ressurreição (seja individual, coletivo e local), quando tudo parecia sem esperança.

Em terceiro lugar, é fruto do que aprendemos sobre o amor Divino através do nosso próprio fracasso. Tenho certeza de que este foi um grande fator em Corinto. Quão profundamente eles reconheceram seu fracasso! Eles afundaram, mergulharam no pó, com a sensação de que haviam sido um fracasso miserável como assembléia. E então, impressionados com a compreensão do seu próprio fracasso, descobriram que havia amor derramando sobre eles, através deste Apóstolo, provindo do coração de Deus; e essa descoberta constituiu seu novo testemunho.

Em quarto lugar, deve nascer do quebrantamento e do alargamento do coração que surge através da consciência da fraqueza. Suponho que, se alguém deveria estar consciente de sua própria fraqueza, esse seria o povo de Corinto. Há, de fato, indicações nesta Segunda Carta de que eles chegaram quase ao desespero em relação a eles mesmos. Acho que essa percepção de sua própria falibilidade e falta de auto-confiança simplesmente os sobrecarregou, transbordou. Entretanto, foi por meio disso que eles chegaram a esse alargamento de coração. Se nós estamos gemendo debaixo da consciência de nosso próprio fracasso, não seremos mesquinhos e sórdidos com os fracassos de outras pessoas; seremos muito mais pacientes e compreensivos – totalmente diferentes, com um coração muito maior. Diremos: 'Bem, eu mesmo preciso andar com muito cuidado. Mas pela graça de Deus, aqui estou eu!' Isso é grandeza de coração, verdadeiro quebrantamento.

Em quinto e último lugar, que dedicação ao Senhor deve resultar de um senso de responsabilidade por Sua honra na localidade e no mundo. Acho que é isso que entra em cena aqui. Se isso não estiver presente, todo o resto não significa nada. Deve ter ficado claro para os coríntios que eles estavam decepcionando o Senhor na sua localidade. A condição deles, a situação entre eles, estava apenas trazendo desonra ao Senhor. E isso provocou um sentido de responsabilidade: 'Oh, não podemos nos permitir decepcionar o Senhor! Pelo amor do Senhor, pelo amor do Seu Nome, devemos acertar as coisas entre nós, custe o que custar.' Há muito nos capítulos posteriores de Isaías sobre o Nome do Senhor em Sião, quando restaurado. E assim, na igreja de Corinto, este sentido de responsabilidade pelo Seu Nome e pela Sua honra, naquela vizinhança e naquela cidade e no mundo, produziu uma nova dedicação para o Senhor.

Voltamos à nossa pergunta: “A quem é revelado o braço do Senhor?” Bem, para aqueles, como vimos, que aceitam as implicações da Cruz. Tudo isso é o resultado, a operação da Cruz. Tudo isso vem de Isaías 53. A restauração de um testemunho como esse só pode ser resultado da Cruz. A Cruz é a base de tudo em todo testemunho.

Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.