por T. Austin-Sparks
Capítulo 10 – O Homem Celestial e a Palavra de Deus
Ler: Mat. 4:4; João 6:63,68, 8:47, 14:10; 1 Ped. 1:23,25; Heb. 4:12,13; 1 João 4:17.
Você irá notar que aquilo que está dito nas primeiras quatro passagens acima surge do fato de que o Senhor Jesus era o Homem Celestial. Na tentação no deserto, como registrado na passagem em Mateus, vemos que foi após a abertura dos céus e da atestação do Pai, “Este é o Meu Filho amado...” que o inimigo desafiou tudo o que esta designação de Cristo como Homem Celestial implicava. “Se tu és o Filho…” As tentações se basearam no fato da procedência celestial do Senhor Jesus. Nas passagens do evangelho de João, o mesmo aspecto é visto. Como já temos percebido, durante o tempo todo João mantém em vista a procedência celestial do Senhor Jesus, desde as primeiras palavras de seu evangelho até o fim. O desafio do Senhor Jesus carrega este mesmo significado: “Não crês que estou no Pai...” O Homem Celestial é trazido diante de nós neste ponto em relação à Palavra de Deus.
Encerramos a nossa meditação anterior ao lidar com o princípio vital da redenção, e dissemos que este princípio, que é a vida eterna, torna a redenção, que está perfeita em Cristo, progressiva em nós. A redenção é introduzida em nós com o recebimento da vida eterna, e, à medida que ela opera, trabalha e aumenta, nós entramos cada vez mais no benefício da redenção. Os reais valores da redenção tornam-se nosso em experiência pela operação da vida do Redentor em nós, o Redentor operando em nós pela Sua própria vida.
Em João vinte, no verso vinte e dois, temos um incidente registrado, o qual tem dado origem a certa medida de perplexidade: “...Ele assoprou sobre eles, e disse: Recebam o Espírito Santo...” Talvez queiramos uma explicação deste ato, e destas palavras, e penso que a explicação é que aquilo que Ele fez e disse foi em modelo, e não imediatamente em realidade; isto é, foi um ato representativo da parte do último Adão. João vinte nos vê no terreno da ressurreição junto com o Senhor Jesus. Lembremo-nos do que está escrito: “O primeiro Adão se tornou alma vivente. O último Adão tornou-se espírito vivificante”. (1 Cor. 15:45). Isto deve, na realidade espiritual, estar relacionado à Sua ressurreição. Antes da Cruz, Ele não era, no sentido pleno, nem espírito vivificante nem o último Adão. Tudo isto estava representado e resumido em Cristo, mas, no sentido de geração, isto somente começa no terreno da ressurreição. Na ressurreição Jesus se tornou o último Adão, o espírito vivificante. Assim, na ressurreição, Ele executa este ato representativo, padrão e profere estas palavras representativas na condição de último Adão, cumprindo, no sentido espiritual, as palavras de Apocalipse três, verso um: “...o princípio da criação de Deus”. No sentido literal, Ele era isto no princípio deste mundo. Ele foi o princípio da criação de Deus. Isto não significa que Ele foi o primeiro ser criado por Deus; significa que Ele literalmente começou a criação de Deus, em relação a este mundo.
Na nova criação Ele está assumindo este lugar no sentido espiritual: “...o princípio da criação de Deus”. No princípio da criação literal, houve um sopro de Deus no homem, o sopro da vida. Agora, como último Adão, como espírito vivificante, Jesus assopra sobre eles. É um ato simbólico. É o último Adão agindo de um modo padrão em relação aos primeiros membros da nova criação, o princípio da criação de Deus. Ele está, de forma simbólica, infundindo vida eterna na nova criação. É apenas um ato simbólico, porque o Espírito ainda não havia sido dado. A expressão plena disto veio mais tarde, no pentecoste.
Aqui está a vida em relação ao Homem Celestial, no sentido pleno. Nós agora chegamos a trazer todo este princípio de vida no Homem Celestial em relação à Palavra de Deus. A Palavra de Deus está intimamente relacionada a esta vida, e a vida está intimamente ligada à Palavra de Deus, ambas como estando no Homem Celestial, a vida e a Palavra. A vida e a Palavra não são coisas que estão nele, mas Ele próprio é estas duas coisas. Jesus é a Palavra e Ele também é a vida; a vida e a Palavra estão nele como sendo o Seu próprio Ser. A Palavra é tanto a fala como também a Pessoa. Se você teve o trabalho de estudar a técnica da questão que é gerada no emprego das palavras “Logos” e “Rema”, você sabe quão difícil é distinguirmos uma da outra. Você sabe como elas se chocam uma contra a outra, e quão frequentemente elas interagem e se tornam uma só. Assim é que a Pessoa possui a palavra e a palavra é a Pessoa. Há uma diferença, e, contudo, ambas estão ligadas à Pessoa. Iremos ver o que isto significa à medida que prosseguirmos.
Em primeiro lugar, como dissemos, o Senhor Jesus, como o Homem Celestial, foi gerado pela Palavra. O anjo visitou Maria e lhe apresentou a Palavra de Deus, e esperou que Maria respondesse a ela, antes que houvesse qualquer resultado vivo, e quando, após considerar e lutar a sua batalha, devido ao problema e à dificuldade, bem como o custo que aquilo lhe implicaria, ela respondeu: “Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a Tua Palavra”, então o Cristo Vivo foi implantado.
Na tentação no deserto, está claramente indicado a nós que, por detrás das coisas, era a Palavra de Deus que estava governando o Senhor. Cada tentação era enfrentada com a Palavra de Deus: “Está escrito...” A Vida depende da Palavra de Deus: “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus” (Mat. 4:4). No Homem Celestial a questão da vida está ligada à Palavra de Deus. Se você tomar o oposto disto, você sabe que o homem terreno morre, porque ele rejeita a Palavra de Deus; sua vida depende da Palavra de Deus e de sua atitude em relação a ela. Aqui o último Adão é aceito na mesma base, e, à medida que Ele enfrenta as três tentações com a Palavra de Deus, fica perfeitamente claro que Sua vida estava ligada à Palavra de Deus. Era a Palavra de Deus que estava governando toda esta experiência, e seu resultado. O Homem Celestial estava sendo atacado com o propósito de removê-lo de Sua vida celestial, por assim dizer, para que Ele, de alguma forma, recusasse, violasse ou ignorasse a Palavra de Deus. Ele manteve Sua posição de Homem Celestial na vida, tendo por base a Palavra de Deus.
Não apenas foi Ele gerado pela Palavra, e por ela provado, mas, em terceiro lugar, Cristo foi governado durante toda a Sua vida terrena pela Palavra de Deus. Toda a Lei e os Profetas se aplicam a Ele. Disse Ele aos líderes dos judeus: “Examinais as Escrituras porque julgais ter nelas a vida eternal; e são elas que de Mim testificam” (João 5:39). A sugestão não afeta imediatamente a nossa consideração, mas é digna de nota. Em efeito Ele estava dizendo: “Em vossa busca pela vida eterna nas escrituras, é a Pessoa que está nas escrituras que vós precisais conhecer; é nesta Pessoa, em quem as escrituras estão reunidas, é que a vida eterna é encontrada”. Esta é a força da afirmação: “…são elas que dão testemunho de Mim”. Ainda, quanto aos dois discípulos no caminho de Emaús, após a ressurreição, é dito que Jesus explicou a eles tudo quanto havia nas escrituras a Seu respeito, “começando por Moisés e passando por todos os profetas”.
Enfatizamos, então, que todas as escrituras se aplicam a Ele. Ele encarnou e cumpriu todas elas. Quantas vezes Ele disse, enquanto estava aqui na terra, a respeito de certo movimento, de certo ato, de certa experiência, de certa afirmação “...para que se cumprissem as escrituras...” Se você nunca reparou as ocasiões nas quais isto ocorreu, você deveria fazê-lo. Vale a pena reuni-las.
Agora quero que você observe o seguinte. O Senhor Jesus, em toda a Sua vida terrena, estava sendo governado pela Palavra de Deus. Quão necessário foi, então, para Ele caminhar no Espírito, para que a Palavra de Deus pudesse ser cumprida. O que isto significa? Tome, por exemplo, o Velho Testamento. Você acha que todas as declarações do Velho Testamento estavam sempre presentes na consciência mental do Senhor Jesus, e que, sempre que Ele ia fazer algo, Ele recorria ao Seu manual, e dizia: “e agora: faço isto, ou faço aquilo? Que escritura devo cumprir?” Embora cada parte da escritura estivesse controlando a Sua vida, havia um sentido no qual Ele era responsável por tudo. Toda a escritura se aplicava a Ele. Mas Ele não carregava elas em Sua cabeça, ou num livro, recorrendo a elas em relação à Sua conduta, aos Seus pronunciamentos, aos Seus atos, às Suas experiências, quanto ao que era permitido ou não, quanto ao que Ele podia ou não fazer. Embora a Palavra de Deus estivesse ricamente nele, embora Ele tivesse um grande conhecimento delas — e isto fica muito claro à medida que lemos as Suas declarações — contudo, não era desta maneira que a Palavra de Deus O governava; como se Ele, em cada ocasião e em cada ato, tivesse que trazer as escrituras à lembrança, a fim de agir corretamente. Ele se movia no Espírito, e assim sendo, Ele se movia em conformidade com a Palavra de Deus. Quando necessário, o Espírito da vida trazia a Palavra de Deus à Sua lembrança, e Ele era capaz de usá-la. E como Ele a usava! Porém, independentemente de qualquer citação da escritura, e de qualquer memória da passagem particular que governava determinado incidente, o Espírito se movia com vida, em relação à Palavra de Deus. Jesus era governado pela Palavra de Deus, de modo que, mesmo quando, como Homem, Ele ficou indefeso na Cruz, incapaz de fazer alguma coisa, a situação foi a mesma: “para que se cumprissem as escrituras”. Novamente, está escrito que, quando Ele estava morto na Cruz, e os soldados vieram para quebrar as pernas dos crucificados, porém, viram que Jesus já estava morto, e não precisaram quebrar-lhe as pernas, “para que se cumprissem as escrituras ... Nenhum osso será quebrado” (João 19:36). Este Homem, em todas as coisas, está debaixo do governo da Palavra de Deus, por causa do Espírito que está nele, por causa da direção do Espírito, por causa do Espírito assumindo a responsabilidade.
Posso ver um perigo aqui, e irei salvaguardar o que estamos dizendo, mas vamos, antes de tudo, enfatizar a seguinte lei. Se estivermos andando no Espírito e nos movendo segundo a vida do Homem Celestial, a nossa vida será ordenada conforme a Palavra de Deus. Algumas vezes não iremos saber que escritura se aplica a um dado momento, mas iremos ver algo acontecendo; iremos saber que naquele ponto fomos avaliados; é como se alguma coisa dentro de nós falasse: Isto não está certo, você terá que corrigir aquela declaração; há um defeito nisto, e você irá ter que fazer melhor. Quantas vezes lidamos com isto. Depois descobrimos onde estávamos enganados. O Espírito de vida não deixa passar nada que seja contrário à Palavra de Deus, se estivermos andando em Espírito. Certamente isso deve ser um grande conforto para nós, e uma grande ajuda.
Mas há um grande perigo do qual precisamos tomar cuidado. O que dissemos não significa que podemos assumir o curso de andar no Espírito e desprezar a Palavra de Deus. Não podemos dizer: Bem, andar no Espírito é tudo o que precisamos para estarmos de acordo com a Palavra de Deus; não precisamos nos preocupar com isto. Há muitas pessoas que vivem naquilo que chamam de seu “espírito”. Elas “obtém tal espírito da parte do Senhor”. Elas recebem algo e agem baseadas naquilo, e, depois, descobre-se que se trata de uma violação direta da Palavra de Deus. Quantas vezes nós nos deparamos com isto. As pessoas recebem coisas “da parte do Senhor” e fazem aquilo que pensam terem recebido do Senhor, e fica muito claro que a Palavra de Deus é absolutamente contra aquilo que elas fizeram.
Assim, o assunto exige cuidado. “Que a Palavra de Cristo habite ricamente em vós em toda sabedoria...” (Col. 3:16) que esta seja a base para o Espírito Santo. Se, contudo, você estiver fazendo algo que não possua um texto que trate exatamente do assunto em questão, o Espírito Santo irá conformar você àquilo que Ele conhece ser a Palavra de Deus, e estará lhe sustentando. Como isto é verdade! Alguns de nós descobrimos que a nossa memória natural tem falhado bastante. Muitas vezes uma citação equivocada da escritura não toca a doutrina, absolutamente, mas o ponto é o seguinte, que há uma Inteligência governante que nos faz conhecer a Palavra de Deus, embora não sejamos, no dado momento, capazes de dar uma passagem específica em seu fraseado exato, ou chamá-lo à memória. Se pertencemos ao Homem Celestial, somos governados por esta Inteligência. “Como Ele é, assim somos nós neste mundo” (1 João 4:17). Aqui está o Homem Celestial governado pela Palavra de Deus, na medida em que havia vida nele.
O que é verdade sobre a Cabeça deve ser verdade sobre os membros. Se estamos ligados ao Homem Celestial, tornamo-nos parte deste Homem Celestial Corporativo, e esta mesma vida está em nós, e iremos caminhar pela Palavra de Deus. Seremos governados por ela através do Espírito de vida que nela está, e este Espírito de vida é onisciente. Gostaria que todo o povo do Senhor vivesse desta maneira. Isto nos livraria de todos aqueles tipos de coisas mortais, como ficar caçando heresias, ficar sempre suspeitando de algo, fazendo o papel de guardiões da doutrina, ficar de olhos abertos contra tudo o que estiver errado, lançando uma praga de morte sobre tudo. Se vivêssemos no Espírito, saberíamos em nossos corações que a coisa está certa ou não, sem projetar nossas mentes analíticas sobre as coisas; o Espírito iria dar testemunho em nossos corações. Isto seria vida e salvação. O diferente disto é uma existência miserável para qualquer pessoa.
Agora você vê o Homem Celestial, a vida eterna, e a Palavra governando por toda a parte. Quanta diferença há entre ser governado pela letra e ser governado pelo Espírito. Nós podemos ter o livro; podemos possuir toda a carta, e podemos estar constantemente exclamando: “À lei e ao testemunho!” Podemos, assim, nos tornar muito legalistas, examinando na letra o tempo todo. O Senhor Jesus não agia desta maneira, nem o apóstolo Paulo. Zelosos como eram pelas escrituras, pela Palavra de Deus, totalmente governados por ela, o que interessava para eles era a Palavra viva. Disse o nosso Senhor Jesus: “...as palavras que vos tenho falado são espírito e vida”; “...a carne para nada aproveita” (João 6:63). Nós podemos matar com a letra. Podemos matar com a Palavra, como palavra. Certamente queremos ser libertos de tratar as escrituras apenas como palavras, como letras, e queremos ser trazidos para um lugar onde seja o Espírito na Palavra dando vida. Quanta diferença há entre estes dois terrenos! Um leva apenas à morte, à paralisia, ao arrefecimento e à ruína; o outro nos leva à total condenação e julgamento que é necessário para aniquilar tudo o que é mal. No terreno do Espírito as coisas não são deixadas em seu estado destruído, sem qualquer significação, o que é sempre muito comum acontecer quando se trata apenas de algo da letra.
Assim, você tem os dois aspectos da Palavra para o crescimento em Cristo.
Primeiro, a Palavra é uma expressão inspirada do Espírito. É isto o que a Palavra de Deus deve ser, e não apenas algo que foi escrito. Segundo, o Espírito de vida associado à Palavra. Isto levanta uma grande questão, uma questão que talvez seja um tanto perigosa de se expor ao público nestes dias, e, respondê-la, iria requerer uma boa dose de explicação. A questão é a seguinte: Até que ponto a Palavra escrita, tal como está, é a Palavra de Deus? Este livro pode ser tomado e o mesmo fragmento pode ser usado de cinquenta formas diferentes ao mesmo tempo. A mesma passagem da escritura pode servir de base para uma dúzia de coisas diferentes, todas mutuamente excludentes e contraditórias. Qual dessas doze ou cinquenta é a Palavra de Deus? Você pode pegar um texto da escritura e dizer: esta é a Palavra de Deus! Como você irá provar isto? Todas essas diferentes pessoas tomam a Palavra de Deus e conseguem um significado diferente, um resultado diferente, e agem de maneira diferente, e justificam um determinado curso, e a mesma Palavra produz um conflito terrível e oposição entre diferentes grupos de pessoas. Até que ponto isto representa a Palavra de Deus, do modo como é apresentada? Meu ponto é o seguinte: creio que algo a mais é necessário para tornar a Palavra de Deus verdade, em plenitude, e este algo é o Espírito de vida que está nela. Este Espírito de vida (estamos pensando no Espírito Santo agora, não uma abstração ininteligente) deve Ele mesmo usar e aplicar a Palavra, a fim de torná-la Palavra de Deus. Não creio que você pode conseguir qualquer resultado Divino apenas citando a escritura como escritura. O Espírito Santo tem que entrar na Palavra e expressar a Si mesmo nela, vivificá-la, para que você obtenha o resultado Divino, por causa do objetivo em vista. Um Homem Celestial vivo não é feito apenas de palavras, ainda que sejam palavras da escritura. É isto o que muitas pessoas têm tentado fazer. Elas têm tentado construir a igreja por meio de palavras da escritura, têm tentado constituí-la por meio do que está aqui escrito, e, assim, você obtenha uma dúzia de diferentes igrejas, todas baseadas no que chamam de Palavra de Deus, e a coisa não tem vida. É um Homem Celestial vivo que Deus tem em vista, e, para produzir isto, o Espírito precisa operar através da Palavra. “As palavras que vos tenho dito são espírito e vida”, disse o Senhor a Seus discípulos. “Senhor, para quem iremos nós? Só Tu tens as palavras de vida eterna”. Da parte de Pedro, o porta voz dessas últimas palavras, esta era uma palavra de discriminação. Os escribas e fariseus tinham as Escrituras. Eles alegavam que tudo o que eles tinham e faziam estava na Palavra de Deus. Ah sim, mas eles conheciam as palavras como palavras de vida eterna. Há uma diferença. Esta vida está no Filho. A palavra tem que estar em relação viva com o Senhor Jesus para que as escrituras sejam eficazes.
Isto opera, em primeiro lugar, soberanamente na direção dos perdidos. Você pode tomar a Palavra de Deus da forma como ela está escrita e pregá-la, porém, você tem que deixar toda a questão com o Espírito. Pregue a Palavra a uma multidão de cinquenta, cem mil, e, para novecentos e noventa e nove, a palavra será apenas uma coisa morta. Elas não conseguem enxergar nada, porém, um dentre os mil é soberanamente tocado. Esta palavra é algo mais do que apenas um discurso, mais do que letras, esta palavra é espírito e vida. Isto não é um acidente, não é algo por acaso, mas um ato soberano. O Espírito de Deus tem que vivificar a Palavra em relação àquela pessoa. Esta é a loucura da pregação, em certo sentido, que você tem que pregar, sem garantia de que muitos irão ser tocados pela Palavra de Deus. Você tem que se lançar às águas e crer que Deus, em algum momento irá vivificar a Palavra e tocar alguma vida, embora a maioria possa não ser tocada. Este é o elemento extra, o Espírito de vida na Palavra de Deus, operando soberanamente em relação ao perdido.
Esta, naturalmente, é a Palavra criadora, que nos faz ver que no Homem Celestial a Palavra de Deus é um ato de Deus, e não apenas uma declaração de Deus. No Homem Celestial a Palavra de Deus nunca é apenas uma declaração, é um ato. Nós falamos muitas coisas, e, então, olhamos ao redor à procura de um resultado, com o seguinte pensamento: “Qual é o valor de tudo isto?” Você jamais terá que procurar pelo resultado da Palavra de Deus no Homem Celestial, ele está lá. Você pode não enxergá-lo, mas ele está lá. A Palavra, em relação ao Espírito de vida em Cristo, é um ato; algo realizado; e, quando a Palavra vem pelo Espírito de vida, aqueles a quem ela é direcionada pela inteligência do Espírito jamais poderão ser os mesmos novamente, embora possa parecer que continuam da mesma maneira: “...a palavra que tenho falado, esta mesma irá julgá-lo no último dia” (João 12:48). Algo foi falado; a Palavra veio, e a coisa foi feita, e jamais poderá ser desfeita. Mais cedo ou mais tarde as pessoas em questão irão ser confrontadas, e tudo irá se reportar àquela hora quando o Espírito deu expressão à Palavra. Isto é um fato tremendo. Este é o valor de oferecer a Palavra do Espírito, porque ela é um ato. Ela é criadora. Ela é algo realizado, não algo apenas dito. Oh, precisamos reconhecer que a Palavra no Espírito Santo é algo realizado, não apenas algo falado. A Palavra de Deus é sempre um ato: “...os mundos foram criados pela palavra de Deus...” (Heb. 11:3). A Palavra do Senhor é uma benção. Não se trata apenas de dizer ‘Deus te abençoe’. A Palavra é uma benção em si mesma; ela traz a benção. Ela é um ato.
No salvo há outro aspecto. O primeiro aspecto é o lado criador, soberano. Agora, no caso do salvo, onde os envolvidos são pessoas do Senhor, a operação do Espírito em relação à Palavra de Deus não é mais apenas uma questão de soberania. Em se tratando de pessoas crentes, a Palavra não é dada visando trazer criação, pois isto já foi realizado. Nós ficamos em pé por causa da Palavra do Senhor falada soberanamente pelo Espírito em nossos corações, tendo, assim, nos tornado Seus filhos, gerado pela Palavra de Deus. Isto é um ato soberano, mas, a partir desse momento, aquilo que é apenas um ato soberano cessa e o crescimento se dá por meio do Espírito de vida na Palavra, porém, sobre uma base onde há vida em nós para corresponder à vida que está na Palavra. A vida na pessoa, ou num grupo de pessoas, é a base do crescimento conforme a Palavra de Deus, a qual possui vida em si mesma. Considere a seguinte ilustração, baseada em nosso alimento natural. Não importa o quanto você alimente uma pessoa morta, você não irá conseguir desenvolvimento algum, nenhum tipo de crescimento. É inútil alimentar um cadáver. Precisa haver vida no homem, para que ele interaja com a vida que está no alimento, para que, então, se beneficie dela, para que coopere com ela, a fim de que haja crescimento. É isto o que queremos dizer com a atividade que carrega a marca da soberania. O ato soberano é algo separado de nós mesmos; é a graça de Deus aos pecadores os quais nada podem oferecer em troca. Mas, agora que a vida está em nós, o nosso crescimento se dá sobre a base da vida que está dentro de nós, em cooperação com a vida que está na Palavra de Deus. Você pode pregar para as pessoas que não possuem muita luz, e pregar no Espírito Santo, e pode não obter muito resultado devido à medida limitada de vida dentro delas. Mas você consegue uma resposta tremenda à palavra viva quando as pessoas estão todas vivas para o Senhor, quando há vida nelas. O crescimento vem desta maneira, a vida em nós respondendo à vida na Palavra, formando o Homem Celestial.
O Espírito que acompanha a Palavra transmite vida, vida onde havia morte, e faz isto de modo soberano; porém, no caso das pessoas que já foram trazidas a Cristo pela Palavra, o Espírito que acompanha a Palavra requer uma resposta delas. A mesma vida na Palavra governa as nossas vidas, do mesmo modo como governou o nosso novo nascimento. O Senhor foi verdadeiramente gerado pelo Espírito Santo, o Espírito de vida, pela Palavra e através da Palavra. Agora, para o governo de Sua vida, a mesma vida que por meio da Palavra operou no Seu nascimento também foi a vida que O governou; isto é, a mesma vida que traz o ser à existência também deve estar na Palavra que governa a vida da pessoa, a fim de levá-la ao pleno crescimento. É o princípio de vida que é a coisa mais importante. É esta novidade, este frescor que conta – se preferir, esta originalidade. Não compreenda mal; não estamos usando a Palavra no sentido natural. Queremos dizer que no nascimento pelo Espírito de vida existe algo que não existia antes; é algo original, novo. Somos uma nova criação em Cristo Jesus. Chamamos isto de “novo nascimento”. Não é somente algo novo, recente, mas algo que não existia antes.
Em relação à Palavra, tem que ser desta maneira. A Palavra precisa vir com toda a força de algo que não existia antes. Tem que haver este sentido de originalidade Divina, de algo novo, que traz espanto, admiração. Novamente, você pode fazer a prova. Quando a Palavra está nas mãos do Espírito Santo, embora você possa ter lido mil vezes uma passagem, e ter obtido algo dela, você pode voltar novamente a ela e dizer: Eu nunca vi isto antes! Ela está viva e contém um significado e um valor diferente de tudo que havia antes! Há toda diferença entre isto e aquela coisa velha que colocamos em livros como resultado do nosso estudo da Bíblia. O Senhor deseja ter os Seus ministros neste terreno onde eles manuseiem a Palavra de Deus com vida. É o Homem Celestial sendo governado pela vida celestial na Palavra, de modo que tudo seja constantemente novo, fresco, original.
Quão verdadeiro isto é para ser experimentado. Houve ocasiões em que achávamos que conhecíamos tudo sobre determinado assunto na bíblia; falamos sobre ele de forma tremenda, e ele permaneceu como nosso tema por um longo período. Então, o tempo passou e nós o deixamos de lado, porém, o Espírito do Senhor nos leva a ele novamente, e aí, é como se nunca houvéssemos enxergado aquela verdade antes. Descobrimos que podemos voltar aos antigos temas, como são chamados, com tal novidade. As demais pessoas podem não perceber o que está acontecendo em nós. Elas podem ouvir as mesmas velhas coisas novamente, mas dirão: ‘Há uma novidade, um novo entendimento, e está claro que o Espírito Santo não esgotou o assunto; Ele ainda tem algo mais a nos dizer a respeito’. Temos que ser cuidadosos com a forma com que reagimos mentalmente a coisas como esta. Muitas vezes somos tentados a tomar a seguinte atitude: Eu tenho falado acerca disto tantas vezes que as pessoas devem estar cansadas! O Espírito Santo está dizendo: fala novamente; não leve em conta o que as pessoas pensam; se elas ouviram isto mil vezes, fale novamente! E, quando você dá ouvido ao Espírito, algo é realizado, o qual não havia sido realizado antes, com todas as declarações anteriormente feitas sobre o mesmo tema. Cuidado com a mania de classificar as coisas na Palavra de Deus, dizendo que nós já esgotamos tudo. Se você está lidando com os temas da Bíblia, como tais, você também pode classificar a coisa toda de imediato. Se você se mover no Espírito com a Palavra de Deus, jamais haverá um tempo em que alguma parte da Palavra de Deus se torne obsoleta. É a mesma nova vida, que não havia antes, que veio até nós para nos constituir como parte do Homem Celestial, o qual é governado pela Palavra ao longo de todo o caminho, para um aumento constante, para um crescimento constante.
Lembre-se, então, que é uma questão de vida. Lembre-se de que a doutrina vem da vida, e não a vida da doutrina. É a igreja que vem da vida, e não o contrário. A vida não é um acessório da doutrina, nem da igreja, mas algo que está ligado ao Homem Celestial de forma viva, algo que é de vital necessidade; então você terá a doutrina e a igreja. Na Palavra, da forma como a temos, a doutrina surgiu da vida. A igreja já existia antes que a doutrina a respeito dela fosse dada. Foi a ligação com o Homem Celestial que produziu a doutrina da igreja. A igreja surgiu a partir de um relacionamento vivo, e não de um aceitar uma revelação do que seja a igreja, procurando colocar tal revelação em operação. A vida vem antes de tudo, e, onde a vida é encontrada, todo o resto é conseqüência. É inútil tentar passar a doutrina da igreja, ou qualquer outra doutrina, para as pessoas, se elas não estiverem vivas para o Senhor. O Senhor sabe o que Ele está fazendo. Você não pode ir a qualquer parte do mundo, nem mesmo a pessoas cristãs, com toda a sua doutrina, com toda a sua revelação, e ter a garantia de que, quando você falar a palavra, as pessoas irão aceitá-la. Você precisa ir aonde o Espírito levar você, pois Ele sabe exatamente onde há suficiência de vida, a qual preparou terreno para que haja resposta ao que você irá dar. Como gostaríamos de sair pelo mundo afora e falar para todo o povo de Deus daquilo que Ele tem mostrado a nós, e dar a eles uma revelação do Corpo de Cristo! Poderíamos ir e organizar grandes cruzadas e reunir as pessoas, mas seria apenas para vê-las olhar fixamente para nós e dizer: Que doutrina estranha! Você não pode agir desta maneira. O aumento tem que estar sobre uma base de vida; porque a doutrina não vem primeiro, mas sim a vida. Você não pode obter a igreja simplesmente tentando obtê-la! Tem que haver vida, e a vida, através de suas maneiras de operar, forma a igreja; a vida torna-se a realização da igreja. O inverso disto apenas nos leva à Babilônia.
O que é Babilônia? Babilônia representa a perda da autoridade de Deus como algo vivo. Foi no reino de Jeoiaquim , o rei que pegou um canivete de escrivão e cortou a Palavra de Deus, que Judá começou a ser levado para Babilônia. Quando ele repudiou a autoridade viva da Palavra de Deus, todos os vasos de ouro e de prata foram levados para Babilônia. É uma parábola. Significa que o povo do Senhor entra na escravidão, no cativeiro, na morte, que ficar fora do lugar de encontro com o Senhor, e a ministração do Senhor não mais acontece na vida, porque os vasos foram embora, foram todos levados. Até aquele momento eles estavam tendo os seus sacrifícios, estavam seguindo com a sua ordem levítica. Mas esta não é a questão, pois você pode ter a forma das coisas, o sistema, e ainda assim estar em Babilônia. É a Palavra do Senhor como algo vivo e espiritual que mantém você livre, lúcido, forte e fora de Babilônia.
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