por T. Austin-Sparks
Capítulo 1 – O Propósito das Eras
“...Ninguém conhece o Filho, senão o Pai...” — Mat. 11:27.
“...aprouve a Deus … revelar Seu Filho em mim...”—Gal. 1:15,16.
“...Considero todas as coisas como perda pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor...” — Fil. 3:8.
“...para que eu possa conhecê-lo...”—Phil. 3:10.
“Descobrindo-nos o mistério da Sua vontade, segundo o Seu beneplácito, que propusera em Si mesmo, de tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra...”— Efé. 1:9,10.
Esta pequena frase no versículo dez é a palavra que irá dominar a nossa meditação — TODAS AS COISAS EM CRISTO.
Estas escrituras falam por si mesmas. Quando ouvirmos a voz interior do Espírito nestes fragmentos da Palavra Divina, certamente iremos começar a sentir uma sensação de tremendo significado, de valor e de conteúdo. Deveremos nos sentir como pessoas que chegam à porta de um novo reino cheio de maravilhas — desconhecidas, não examinadas, inexploradas.
Encontramo-nos no exato limiar deste reino com uma declaração cujo objetivo é o de examinar os nossos passos para o momento, e, se nos aproximarmos com um ar de que já conhecemos ou possuímos tudo, com um senso de contentamento, de satisfação pessoal, ou com qualquer outro sentimento, que não aquele de que precisamos conhecer tudo, então esta palavra deverá imediatamente nos levar a uma paralisação: “...ninguém conhece o Filho, exceto o Pai...” Talvez pensássemos que já sabíamos tudo a respeito do Senhor Jesus; que tínhamos a capacidade de conhecer; que estudar e ouvir, e várias outras formas de nossa própria aplicação e atividade poderia nos trazer conhecimento, mas, na introdução, é-nos dito “...ninguém conhece o Filho, a não ser o Pai....” Tudo o que o Filho é está confinado no Pai; somente o Pai conhece o Filho.
Porém, quando enfrentamos este fato, e reconhecemos as suas implicações, iremos ver que estamos aqui diante de um terreno fechado, ao qual não podemos adentrar, pois não possuímos qualquer equipamento. Não há nada em nós, em termos de capacidade, que nos permita penetrar nos segredos do território de Cristo. Então, após a descoberta deste fato um tanto que surpreendente da absoluta incapacidade do homem de conhecer, por natureza, o próximo fato que nos confronta é: “...aprouve a Deus... revelar Seu Filho em mim…” Embora Deus tenha tudo isto encerrado em Si mesmo, em Seu próprio domínio, e apenas Ele tenha o conhecimento do Filho, está em Seu coração, contudo, dar a revelação. E, dado que somos completamente dependentes desta revelação Divina, e que toda capacidade e facilidade humana é excluída neste sentido, vez que a revelação somente pode ser alcançada através de um descortinar Divino, em nosso interior, estamos fazendo com que fique bem claro que tudo é de graça quando rejeitamos toda e qualquer confiança em obras, quando nos afastamos da auto-suficiência, da auto-confiança, da confiança na carne, e de qualquer orgulho de progresso ou abordagem.
Leia estas duas passagens à luz do que Paulo era, quando conhecido como Saulo de Tarso, antes de o Senhor tê-lo encontrado, e depois, como Paulo, o apóstolo, e você irá ganhar algo mais da força que elas possuem. Saulo de Tarso teria chamado a si próprio de mestre de Israel, alguém muito bem instruído nas escrituras, com certa dose de autoconfiança e auto-suficiência em sua apreensão e compreensão dos oráculos de Deus. Até mesmo alguém como ele terá que chegar a um reconhecimento de que nada daquilo se aproveita no reino de Cristo; onde ele percebe que é completamente cego, ignorante, inútil, totalmente excluído e carente da graça de Deus até mesmo para o primeiro vislumbre de luz; tendo que se humilhar e dizer: “...aprouve a Deus … revelar o Seu Filho em mim”. Isto é graça.
Isto marcou o início; e para a presente meditação, estaremos considerando a inexplorada plenitude daquilo que o próprio Deus colocou dentro do Seu Filho, o Senhor Jesus, em realidade e em propósito, como sendo o objeto de Sua graça em relação a nós. Sua graça tem levado o Senhor a buscar trazer-nos, por revelação, a todo este conhecimento e plenitude que Ele mesmo possui como sendo o Seu próprio conhecimento secreto da Sua plenitude em Seu Filho, o Senhor Jesus. TODAS AS COISAS EM CRISTO.
Jamais será nosso desejo fazer comparações entre os apóstolos, e Deus nos livre de que venhamos atribuir um valor menor a qualquer um deles diferente daquele que o próprio Senhor tem atribuído; contudo, penso estarmos muito corretos ao dizer que, mais do que qualquer outro, Paulo foi, e é, o intérprete de Cristo; e, se o tomarmos como nosso intérprete, como alguém que nos leva aos segredos de Cristo de modo mais pleno, assinalamos como ele encarna aquilo que ele fala. É o próprio homem, afinal, e não apenas aquilo que ele diz, que nos leva a Cristo, num sentido mais pleno e mais profundo.
Algo que tem impelido muito o meu coração em relação a esta questão é a concepção sempre crescente de Cristo que Paulo tinha. Não há qualquer dúvida de que esta concepção era sempre crescente, e, quando Paulo chegou ao final da sua vida terrena, plena, rica, e profunda como ela tinha sido, a visão que ele tinha de Cristo era tal que ainda o fazia clamar: “...para que eu possa conhecê-lo....” Sim, no início de sua carreira, aprouvera a Deus revelar o Seu Filho nele, mas, ao final, era como se ele ainda não tivesse conhecido nada de Cristo. Ele descobriu que o seu Cristo estava incomensuravelmente além do seu pensamento e da sua concepção, e, então, ele entrou na eternidade com um grito em seus lábios: “...para que eu possa conhecê-lo....”
Creio (e não como uma questão de sentimento) que esta será a nossa eterna bem-aventurança, a natureza da nossa eternidade, ou seja, descobrir Cristo. Paulo, como dissemos, teve um grande conhecimento de Cristo. No melhor das hipóteses, nós, aqui, encontramos a nós mesmos murchando em insignificância toda vez que nos aproximamos de Cristo. Quantas vezes já lemos a Carta aos Efésios! Não estou exagerando quando digo que, se a tivéssemos lido por anos, dezenas, centenas, ou até milhares de vezes, cada sentença poderia nos deter novamente sempre que a ela retornássemos. Paulo sabia o que estava falando. Sua concepção era ampla, mas, mesmo assim, ele ainda dizia no final: ‘para que eu possa conhecê-lo’. Não acho que iremos imediatamente conhecer Cristo em plenitude ao passarmos para a Sua presença. Creio que precisamos prosseguir — governado por esta palavra, “as eras vindouras” — descobrindo e explorando a Cristo. Esta concepção sempre crescente de Cristo era o que mantinha a vida de Paulo, que mantinha vivo o seu ministério. Com ele jamais houve qualquer estagnação. Ele jamais chegou a algum ponto ou a algum lugar onde houvesse qualquer sugestão de que agora ele conhecia tudo. O que ele parece dizer é: Eu ainda não conheço tudo, mas vejo em parte, contudo verdadeiramente, com o olho do espírito, vejo um Cristo tão grande, tão vasto que me mantém nesta busca, neste seguir em frente. Prossigo avante; esqueço das coisas que para trás ficam, considero todas elas como refugo por causa da excelência do conhecimento de Cristo Jesus, para que eu possa conhecê-lo. Nesta concepção crescente de Cristo, Paulo afastou-se bastante daquela sua posição de mestre dos judeus, ou do próprio judeu que era, em seu melhor.
Paulo começou com uma concepção judaica a respeito do Messias, fosse ela qual fosse. É quase impossível dizer qual era a concepção judaica a respeito de Cristo. Você tem indicações do que eles esperavam que o Messias fosse ou fizesse, mas não há nada que indique exatamente qual era, em plenitude, a concepção que eles tinham acerca do Messias; sem dúvida era uma concepção muito limitada. Havia uma grande dose de incerteza, o que, a partir de certo ponto, traía o pensamento judaico em sua longa espera pelo Messias. O Messias deles representava algo terreno e temporal; um reino terreno, um poder temporal, com todas as vantagens terrenas e temporais que viriam a eles nesta terra a partir do reinado do Messias, do Seu governo, de Sua aparição. É aí que iniciamos nossa consideração sobre a concepção que Paulo tinha de Cristo. É bem verdade que a concepção judaica não restringia a benção apenas a Israel, mas admitia que a vinda do Messias, através dos judeus, resultaria em bênçãos para todas as nações; contudo, tal concepção ainda continuava sendo terrena, temporal, limitada a coisas aqui deste mundo. Se você ler os evangelhos, especialmente o de Mateus, irá ver que o esforço dos crentes judeus consistia em mostrar que Cristo havia realizado três coisas.
Primeiro, Jesus corrigiu a concepção que eles tinham a respeito do Messias.
Segundo, Jesus cumpriu as maiores esperanças que eles tinham acerca do Messias.
Terceiro, Jesus transcendeu em muito a tudo aquilo que eles tinham imaginado.
Você deve se lembrar que os evangelhos não foram escritos simplesmente para convencer os incrédulos. Eles também foram escritos para os crentes, a fim de ajudá-los através das interpretações. O evangelho de Mateus, escrito como se estivesse num tempo de transição, foi escrito com a finalidade de interpretar e confirmar a fé em Cristo, mostrando quem realmente Ele era, para qual finalidade Ele havia vindo, corrigindo e ajustando, assim, a concepção que eles tinham sobre o Messias. A concepção deles era inadequada, distorcida, limitada, e, algumas vezes, equivocada. Assim, estes escritos tiveram a finalidade de corrigi-los, de mostrar que Cristo tinha cumprido as melhores, as mais elevadas e as mais verdadeiras esperanças e expectativas messiânicas, e havia infinitamente transcendido a todas elas. Você precisa de Paulo para interpretar Mateus, Marcos, Lucas, e João; e ele faz isto. Ele mostra Cristo como alguém em quem cada esperança e possibilidade é alcançada. Estavam eles esperando um reino, uma libertação e uma bem-aventurança terrena? Cristo havia realizado algo infinitamente melhor do que isto. Ele havia realizado para eles uma redenção cósmica; não apenas uma libertação do poder de Roma, ou de qualquer outro poder temporal, mas uma libertação de todo o poder do maligno no universo - “O qual nos libertou do poder das trevas, e nos transportou para o reino do Filho de Seu amor”. Mateus, particularmente, enfatizou a realidade do reino, mas a idéia que os judeus tinham deste reino, com a qual ele se confrontou, era muito limitada, muito terrena, muito estreita. Paulo, com uma nova ênfase, pelo Espírito, traz à vista a natureza e a imensidão do reino do Filho de Deus.
Agora podemos ver o que significa libertação dos nossos inimigos. Não vamos nos aprofundar nisto, apenas daremos uma pincelada. Uma revelação tal como esta foi um corretivo. Ela mostrou um cumprimento num sentido mais profundo do que aquele que eles tinham esperado; mas também transcendeu a mais plena esperança e expectativa deles. Paulo interpretou Cristo para eles em seu mais pleno significado e valor. Ele mesmo havia começado no nível deles. A concepção que eles tinham de Cristo tinha sido a dele próprio. Mas, após ter agradado a Deus revelar seu Filho nele, deu-se início um aumento contínuo do conhecimento que Paulo tinha de Cristo, através de uma revelação sempre crescente daquilo que Ele era.
Naturalmente, como Saulo de Tarso, ele jamais acreditou que Jesus de Nazaré fosse o Messias. Isto nos leva um passo mais atrás na concepção de Paulo. Ele acreditava que Jesus era um impostor, por isso ele procurava eliminar tudo o que estava associado a Ele no mundo.
Paulo, então, teve que aprender pelo menos duas coisas. Teve que aprender não só que Jesus de Nazaré era o Messias, mas também que Ele transcendia em muito a todas as concepções judaicas a respeito do Messias, a todas as suas próprias idéias e expectativas associadas ao Messias. Paulo não apenas aprendeu que Jesus era o Messias, mas que, como Messias, Ele era muito maior e mais maravilhoso do que as suas idéias, concepções e expectativas mais plenas. Paulo foi trazido a esta revelação pela graça de Deus.
Não acho que a questão precise de argumentação, pois é difícil de rebater as evidências de progresso na compreensão e no conhecimento que Paulo teve de Cristo, e é claro que o progresso, a expansão e o desenvolvimento em seu conhecimento de Cristo levaram-no a um ajuste. Não me compreenda mal. Tais coisas não levaram a um repúdio a tudo o que Paulo tinha afirmado anteriormente, nem a uma contradição a toda verdade que tinha vindo através dele; mas elas levaram a um ajuste. Na medida em que seu conhecimento de Cristo aumentava e se expandia, Paulo percebia que precisava se ajustar.
Este é um ponto em que muitos têm tropeçado, mas é uma questão que não devemos temer. Muitas pessoas têm medo da idéia de que um homem feito o Paulo — ou qualquer outro homem da Bíblia que fosse Divinamente inspirado — que estivesse tão absolutamente debaixo do poder do Espírito Santo, devesse ainda se ajustar a uma nova revelação. Tais pessoas parecem pensar que isto necessariamente significa que o homem deva mudar de tal maneira a ponto de deixar a sua posição original, negando-a. Mas não significa nada disto.
Tome uma ilustração. As cartas de Paulo aos tessalonicenses foram suas primeiras cartas. Nelas não há qualquer dúvida de que Paulo esperava a volta do Senhor para o seu próprio tempo. Observe suas palavras: “...nós os que estivermos vivos para a vinda do Senhor...” Em sua carta aos filipenses, Paulo já havia mudado de posição, sendo que em suas cartas a Timóteo, tal expectativa já não estava mais com ele: “...já estou sendo oferecido, e o tempo da minha partida é chegado. Combati o bom combate, acabei a carreira....” Paulo havia antecipado o veredicto de Nero. Ele sabia, agora, que não seria por meio do arrebatamento que ele iria para a glória. Estamos nós dizendo aqui que estas duas coisas se contradizem uma à outra? Absolutamente! Em sua caminhada com o Senhor, Paulo chegou a uma revelação mais plena a respeito da vinda do Senhor, e também de seu relacionamento pessoal com Ele, mas isto não removeu ou colocou de lado, ou mudou qualquer fato acerca da doutrina que havia sido passado inicialmente em suas cartas aos tessalonicenses. Tudo o que havia sido colocado lá era totalmente inspirado, dado pelo Espírito Santo, mas ainda era passível de ser desenvolvido no coração do próprio apóstolo, e, quando ele enxergou o significado mais pleno das coisas que tinham vindo a ele inicialmente em sua vida, então descobriu que, em questões práticas, ele precisava se ajustar. Nenhuma revelação fresca, nem avanço em compreensão, jamais o colocou em posição de ter que negar aquilo que tinha sido dado a ele por revelação em tempos anteriores. É uma questão de reconhecer que estas diferenças não são contraditórias, mas o resultado de uma revelação progressiva, suplementar, que ampliava a compreensão, uma concepção mais clara através da caminhada com o Senhor. Certamente estas são evidências de que o progresso na compreensão e entendimento de Paulo levou a ajustes.
Agora, o grande efeito da descoberta de Paulo concernente ao Senhor na Estrada de Damasco não serviu apenas para revelar a ele o fato da filiação de Jesus (ele indubitavelmente descobriu que Jesus de Nazaré era o Filho de Deus, como mostram suas palavras em Gálatas um, versos quinze e dezesseis), mas serviu para tirar Cristo do tempo e levá-lo para junto do Pai nos “tempos eternos”. Isto, talvez, para o momento, não pareça ser muito impressionante, mas é um passo muito importante na direção daquilo que o Senhor quer nos falar. Cristo foi removido do tempo. O ‘tempo' de Cristo, isto é, a sua entrada no tempo aqui neste mundo, torna-se algo como que um parêntesis; não é a coisa principal. É principal se olharmos para ela à luz da queda e da necessidade de recuperação, mas não é, originalmente, a coisa principal do ponto de vista de Deus. Quero que você entenda isto, pois é neste ponto que entramos na maior de todas as revelações que nos foi dada a respeito do Senhor Jesus. Este efeito, em sua experiência no caminho de Damasco, esta elevação de Cristo para fora do tempo, colocando-o na eternidade, veio a estar, na concepção de Paulo, relacionada ao propósito eterno, e no propósito eterno não havia nem queda, nem redenção. Era, por assim dizer, uma curva na linha de Deus através das eras. A linha de Deus era para seguir reto, sem desvio, sem dobra, mas, quando ela atingiu certo ponto, devido a certas contingências que jamais estiveram no propósito de Deus, ela teve que descer, e, então, subir, e prosseguir novamente adiante. As duas extremidades da linha estão no mesmo nível, na eternidade. Você pode, se quiser, imaginar uma ponte no meio desta curva, e Cristo, então, preenchendo a curva, de modo que aquilo que pertencia à eternidade não foi interrompido nele, absolutamente; continua nele. A vinda de Cristo ao mundo e toda a obra da cruz é uma outra coisa, é fruto de uma necessidade causada por certas contingências; mas em Cristo, de eternidade a eternidade, o propósito não foi quebrado, não foi interrompido, permanece em linha reta. Não há hiato em Cristo. Isto veio a estar relacionado ao propósito. Esta é uma grande palavra de Paulo: “Conforme o eterno propósito que Ele propôs em Cristo Jesus nosso Senhor...” (Efésios 3:11); “...chamados conforme o Seu propósito” (Rom. 8:28). São concepções eternas de Cristo, e este propósito, e esses conselhos Divinos estavam relacionados ao universo e ao homem, em particular. Atravessemos esta ponte por um instante, e deixemos o outro lado, pois quero que você observe o curso que a Carta aos Efésios toma. A carta começa com a eternidade. Ela fala muito de coisas que já existiam antes que o mundo fosse criado, e volta a este ponto. Só no meio a carta fala de redenção, não voltando mais a falar deste assunto até que tenha a eternidade passada em vista. A redenção vem para preencher uma lacuna e, então, seguimos de volta para a eternidade.
Deixe agora esta lacuna por um instante. Naturalmente ela nos interessa muito, e teremos que voltar a ela, pois tudo está ligado à redenção, no que tange a nós dentro do propósito eterno; mas deixe-a por um momento e volte a sua atenção para a outra direção. Está definitiva e claramente declarado que todo o plano de Deus sem a redenção já estava completo nos conselhos eternos acerca de Seu Filho, Jesus Cristo, e, neste plano, as eras foram criadas: “...a plenitude dos tempos...” a frase é usada aqui em nossa tradução.
Tenho ouvido tais frases no Novo Testamento interpretadas como sendo as mesmas dispensações que conhecemos na Bíblia; a dispensação de Abraão, a dispensação da Lei, a dispensação da Graça. Eu me pergunto se isto está correto. Grave a seguinte expressão: “...por meio de quem também fez as eras” (Heb. 1:2; R.V.M.). Vamos pensar novamente. Estamos nós corretos ao dizer que isto se aplica ao que chamamos de dispensações tais como mostradas na Bíblia? Sem querer ser dogmático, tenho uma pergunta. Podemos nós dizer que nos conselhos eternos de Deus, em relação ao Seu eterno propósito concernente ao Filho, uma dispensação da Lei teve lugar? Um tempo como a era do Velho Testamento, aqueles períodos de Adão a Abraão, de Abraão a Moisés, de Moisés a Davi, de Davi ao Messias? Seriam essas as eras referidas? Será que Deus criou tais períodos em relação ao propósito eterno? Lembre-se de que toda a obra criadora se deu EM, ATRAVÉS DE, e PARA o Seu Filho, conforme o propósito eterno.
Ainda há eras e mais no porvir. Existem marcas através da eternidade que não são marcas de “tempo”, no sentido nosso da palavra, mas pontos de emersões, de desenvolvimento, de progresso, de aumento, de alargamento. Tivéssemos, eu e você, nascidos no Dia de Pentecoste, e vivido desde lá até o retorno do nosso Senhor (esta é uma dispensação conforme a ordem e contagem deste mundo) jamais teríamos descoberto todo o significado de Cristo. Teríamos descoberto alguma coisa e alcançado certo ponto no conhecimento de Cristo, mas precisaríamos, então, de uma outra era, em condições diferentes, para descobrir coisas que jamais seriam possíveis aqui nesta vida; e quando tivéssemos nos beneficiado desta possibilidade, provavelmente, além dela, existiriam outras novas possibilidades. Não haverá estagnação na eternidade — “... do aumento de seu governo... não haverá fim...” (Isa. 9:7).
Agora, deixe de lado o lamentável quadro da história deste mundo, desde a queda até a recuperação de todas as coisas, e você tem o lançamento das eras nas quais toda a plenitude de Deus em Cristo poderia ser revelada e aprendida progressivamente, através de sucessivas eras, com alargamento e mudança de condições, de facilidades e de habilidades. Este é o significado de crescimento espiritual. Até mesmo a nossa própria vida cristã aqui neste mundo, curta do jeito que é, se for uma vida genuína, que se move sob o poder do Espírito Santo, também é semelhante a uma série de eras, em resumo. Começamos como crianças, e adquirimos o que podemos na condição de crianças. Então, chegamos a um ponto onde temos a nossa capacidade aumentada, onde nossos sentidos espirituais são exercitados. E isto, novamente, resulta numa maior compreensão de Cristo, e, então, um pouco mais tarde, na medida em que avançamos, ainda encontramos esses poderes aumentando, sob o Espírito Santo, e, na medida em que os poderes aumentam, percebemos que ainda há mais terreno a ser ocupado do que jamais imaginamos. Quando crianças, achávamos que tínhamos alcançado tudo! Naturalmente, este é um dos sinais da infância e da juventude. O que se aproveita em nossa idade adulta é o fato de que reconhecemos que existe um vasto terreno à nossa frente, acenando para nós, impedindo que nos acomodemos. É uma eterna juventude!
Assim, deixando todo este estado decadente da criação, você pode ver a criação das eras em Cristo, por Cristo, e através de Cristo, conforme o eterno propósito de Deus de convergir todas as coisas nele; não apenas “todas as coisas” desta nossa pequena vida, deste nosso pequeno dia, desta nossa salvação individual, mas “todas as coisas” deste vasto universo como uma revelação de Cristo, tudo sendo trazido por revelação à compreensão espiritual do homem, e o homem sendo levado a esta experiência. Que Cristo!
Foi isto que Paulo viu; e isto pode muito bem ser resumido em suas próprias palavras: “...a excelência do conhecimento (aquele conhecimento que excede) de Jesus Cristo, meu Senhor.” É Paulo já velho dizendo, “para que eu possa conhecê-lo”. Cristo está acima do tempo, e o tempo, no que se refere a Cristo, somente foi associado à eternidade por causa da necessidade da redenção no propósito eterno.
Devemos nos deter aqui por um instante, mas, ao fazermos isto, permita-me dizer que, com sua concepção sempre crescente de Cristo, houve um correspondente aumento em sua concepção em relação aos crentes. Os crentes assumiram um significado tremendo. Salvar homens do pecado, da morte, do inferno, levando-os para o céu, não era nada em comparação ao que Paulo via em relação ao significado de um crente agora. Tudo o que ele tinha visto a respeito de Cristo em Seu propósito eterno – eterno, universal, vasto, infinito – agora se referia aos crentes: “Assim como nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos ... com o fim de sermos para o louvor de sua glória” nas eras vindouras (Efésios. 1:4,12). Os crentes também são levados para fora do tempo, e ganham um significado totalmente diferente daquele que eles têm aqui. Falaremos mais disto.
Houve uma terceira coisa. Paulo foi capaz de mostrar corretamente o alcance e o lugar da redenção. A redenção podia ser vista em sua extensão plena e como sendo algo mais do que simplesmente pertencente ao tempo. Ela é chamada de “eterna redenção”. A redenção é algo mais do que salvar homens e mulheres do pecado e de seu estado pecaminoso. É projetar todas as coisas para os estágios finais deste universo, tocando todos os seus poderes; é unir a eternidade passada com a que ainda está por vir, é abraçar todas as forças deste universo para a redenção do homem. Paulo é capaz de mostrar precisamente o significado, o valor e o alcance da redenção, e, também, de colocá-la em seu devido lugar, e isto é importante.
Agora, essas são coisas grandiosas. Todas elas precisam ser dissecadas, e o Senhor pode nos capacitar a fazer isto, mas, se você não conseguiu compreender o que foi dito até aqui, irá apreciar o seguinte, que Cristo é infinitamente maior do que eu e você jamais imaginamos. Esta é a coisa que muito fortemente chega até nós através de Paulo. Ele começou com um Messias Judaico relativamente pequeno, e terminou com um Cristo que estava muito além de tudo aquilo que ele jamais tinha visto ou conhecido, de modo que o seu último grito foi: “para que eu possa conhecê-lo....” e isto irá demandar toda a eternidade. Que Cristo! É Cristo quem irá nos remover daqui, que irá nos libertar; mas deixe-me dizer o seguinte, isto não acontecerá por meio de Ele vir e colocar Suas mãos sobre nós e nos levantar, mas através do ser Ele revelado em nossos corações. Como foi que Paulo conseguiu deixar suas concepções judaicas estreitas a respeito do Messias? Simplesmente por meio da revelação de Cristo nele, e, à medida que esta revelação crescia, sua libertação também aumentava. Houve algumas coisas que ele não abandonou por um bom período de tempo. Ele se apegou a Jerusalém quase que até o final da sua vida. Paulo ainda nutria um forte afeto por seus irmãos segundo a carne, e fez muitas tentativas para libertá-los, no plano físico. Mas, finalmente, ele entendeu o significado do Cristo Celeste, a tal ponto de tornar possível a ele escrever a carta aos efésios, aos colossenses, e, então, o judaísmo, como tal, Israel segundo a carne, cessou de ter qualquer importância para ele. Era a revelação de Cristo que o estava emancipando, levando-o para fora, libertando-o o tempo todo. É desta maneira que Cristo é o nosso libertador e emancipador. É apenas o Senhor Jesus quem precisamos conhecer. Tudo o que é pequeno irá perder o seu valor quando conhecermos a Cristo. Tudo que pertence a terra e ao tempo irá desaparecer quando virmos a Cristo, e, no fundo de nossas vidas, haverá algo capaz de nos sustentar através das dificuldades e das horas más. Veremos a grandeza de Cristo e a correspondente grandeza da nossa salvação “...conforme o seu propósito eterno…”
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