por
T. Austin-Sparks
Primeiramente publicado na revista "A Witness and A Testimony", em Jul-Ago 1954, Vol. 32-4. Origem: "Looking Unto Jesus". (Traduzido por Marcos Betancort Bolanos)
Olha sempre para a frente, mantém teu olhar fixo no objetivo a ser alcançado. Reflete sobre tuas escolhas e sobre o caminho por onde andas, e todos os teus. Não te desvies nem para a direita nem para a esquerda. (Proverbios 4:25-27).
“Olhando fixamente para Jesus...” (Hebreus 12:2).
Para o homem em Cristo a vida tem um objetivo claro e definitivo. O Espírito viu bem encher toda a Bíblia com essa verdade, continuamente exortando o crente a perceber que sua vida está firmada no contexto do propósito divino. A carta aos Hebreus não somente apela para nós prosseguirmos até esta meta, mas retrata Cristo como o grande exemplo e prova de que a meta pode ser alcançada. Jesus foi por este caminho; Ele passou por todo o caminho, e Ele chegou ao destino. Além disso, Ele o fez tudo por nós, e pela Sua realização nos deu o terreno da confiança de que a meta pode ser alcançada e o prêmio ser recebido. Ele levou sobre Si nossa humanidade, aceitou o desafio de nossas circunstâncias e experiências, nunca vacilando até que o fim divino foi alcançado. Somos lembrados de que Ele tem triunfalmente cumprido o propósito de Deus, e que por Sua presente posição Ele nos oferece a certeza de que nós também podemos participar no Seu triunfo. Devemos continuar a olhar para Jesus. Mais corretamente, isto deveria ser declarado como: 'olhando fixamente para Jesus'. Este assunto da direção de nosso olhar espiritual é de extrema importância. O homem sábio equiparou um percurso reto e estabelecido com o olhar para a frente e sem se desviar para a direita ou a esquerda. A Palavra de Deus dá clara advertência sobre se sair do caminho da Sua vontade, pois Deus sabe dos perigos envolvidos assim fazendo, e deseja nos poupar do obstáculo ao progresso que pode resultar quando olhamos ou estamos de frente na direção errada. Neste artículo consideraremos alguns destes olhares que devem ser evitados por aqueles que desejam fazer progresso espiritual.
O Senhor Jesus foi muito enfático acerca deste assunto quando Ele declarou que ninguém que coloca a mão no arado, e fica contemplando as coisas que deixou para trás, é apto para o Reino de Deus. Este olhar para trás pode levar a graves tragédias. No deserto isto é o que Israel fez. Egito ficou para trás deles e deveu ter sempre ficado longe, mas nas dificuldades do caminho eles chamaram um ao outro a olhar para trás. “Voltaram atrás, e tentaram a Deus, e provocaram o Santo de Israel” (Salmo 78:41). Eles estragaram todo o curso deles por esta ação, e por muitos anos eles não fizeram nenhum progresso, mas ficaram dando voltas e voltas em circulo; e tudo por causa de olhar para trás. Essa geração falhou em entrar para o que Deus tinha preparado para eles, simplesmente porque eles cederam à tentação de olhar para trás, o qual foi – e sempre é – a direção errada.
Perigos similares assolaram o povo de Deus nos tempos do Novo Testamento. Os crentes da Galácia ficaram incertos pela voz dos Judaizantes, chamando eles a olhar para trás, não para o mundo com sua impiedade, não para abandonar completamente Cristo, mas para olhar em direção a um procedimento religioso que não era a vida espiritual à qual eles tinham sido chamados em Cristo. Eles tinham parcialmente já olhado para trás, e chegado a uma paralisação por causa disto. Previamente, eles tinham estado fazendo bom progresso, como nós sempre fazemos quando mantemos nossos olhos em Cristo, mas agora eles tinham parado e estavam levantando a questão quanto a se eles continuariam mais, ou se eles voltariam para os elementos indigentes que deveriam ter deixado para trás. A carta pretendia advertir eles dos perigos de olhar para trás. A carta aos Hebreus foi escrita para o mesmo propósito. Os interessados podiam ser levados a sentirem a nostalgia emocional do sistema do qual eles tinham sido libertos, portanto, eles tinham que ser lembrados de que perderiam o prazer de Deus se eles recuassem, e foram exortados a prosseguir ao invés, olhando para longe do passado e focando seus olhares fixos no Cristo exaltado. Por mais avançados que possamos estar na nossa experiência cristã, parece não servir de nada quando podemos dar ao luxo de tirarmos nossos olhos do objetivo estabelecido diante de nós e entrar na insensatez de olharmos para trás.
Quando os espias trouxeram o relatório errado concernindo a terra prometida, eles fizeram assim porque eles tinham somente olhado em volta deles, e nunca medido o que eles viram com a realidade de um Deus todo-poderoso. Eles não só imaginaram as dificuldades; eles não precisavam fazer assim, pois as cidades e gigantes eram reais o suficiente. Mas eles mantiveram seus olhares fixos nas coisas em volta deles, nunca elevando seus olhos para aquele de quem a ajuda vem, e dessa maneira eles ficaram desencorajados e desencorajaram o povo de Deus com o que foi chamado uma infâmia. O problema foi que eles olharam apenas nos arredores visíveis e tiraram seus olhos do Senhor. Houveram somente dois deles que mantiveram seus olhares fixos na direção correta, e eles foram os que acabaram indo até o fim. Seus olhos olharam diretamente, e assim seus caminhos foram estabelecidos.
No Novo Testamento Pedro é o grande exemplo do perigo dos que chegam a olhar em volta. Enquanto ele manteve seus olhos em Cristo ele pôde realmente andar sobre a água, mas ele começou a afundar logo que ele os desviava, mudava a direção de sua atenção e começava a olhar para as circunstâncias - “Todavia, reparando na força do vento...” (Mateus 14:30). Mais uma vez seja dito que ele teve muitas razões para seu medo. De fato, existem manuscritos antigos que registram, 'o forte vento'. Por mais que fosse sua insensatez ao deixar circunstâncias externas distraírem sua atenção do seu Senhor que lhe valeu um banho, ainda assim a mão de Jesus tão graciosamente o resgatou de qualquer coisa pior, devemos ter cuidado a todo custo de olharmos em volta em incredulidade quando devemos estar olhando fixamente em fé.
Paulo teve que culpar os Corintios por limitarem suas visões para as coisas imediatamente diante de seus olhos: “Observais tão somente a aparência externa dos eventos” (2 Coríntios 10:7). Ser espiritualmente míope, se focando somente no que está ao alcance da mão, é se tornar demasiado facilmente satisfeito e contento na esfera das coisas espirituais; ter um horizonte pequeno e estreito e falhar em apreciar o muito mais que Deus tem em mente. É muito fácil se estabelecer numa área bem circunscrita e limitada, pensando somente das coisas espirituais com as que estamos familiarizados e que parecem tão importantes para nós, enquanto falhamos em tomar nota do muito mais que jaz além de nós e para o qual nós estamos sendo chamados. Na vida cristã existem poucas coisas mais paralisadoras do que uma assunção de que não há nada além da pequena esfera de nossa experiência. É possível ficar tão fechado, tão míope, que ficamos dando voltas e voltas em circulo, nunca olhando para as novas dimensões da experiência espiritual para a qual Deus nos está chamando, e quase imaginando que sabemos tudo o que há para saber sobre a Palavra de Deus e Seus propósitos em Cristo. Os Coríntios pareceram ter feito isto, a se concentraram tanto nos seus próprios assuntos, mesmo seus próprios dons espirituais, que eles quase ficaram numa paralisação espiritual. Eles estavam olhando para si mesmos, cheios de preocupação pela assembleia própria deles, o qual estava certo o suficiente, mas aparentemente sem serem capazes de apreciar os grandes propósitos de Deus como representados pelo ministério de Paulo. Mesmo os assuntos que têm sido claramente mostrados de Deus e abençoados por Ele podem se tornar um obstáculo quando prendem e mantém a atenção como coisas em si mesmas. Estas são as coisas diante de nossa face, mas que nós fomos destinados sempre a olharmos além delas para o Senhor, e sempre além dos fatores imediatos para os eternos valores em Cristo. Podemos ser de visão curta mesmo com a Palavra de Deus, se nos concentramos somente no que já temos conhecido de Cristo e falhar em apreciar que Deus tem muita mais luz e verdade para romper da Sua Palavra.
Aos Filipenses Paulo escreveu: “... não olhe cada um somente para o que é seu...” (Filipenses 2:4). Ele os estava exortando para não serem sempre governados por como as coisas lhes afetavam pessoalmente, para não medirem cada assunto como se eles ficassem a ganhar ou perder pelo que estivesse acontecendo. Esquecimento de si é um dos segredos do progresso espiritual. Quando, em Sua conversa com a mulher Samaritana carente no poço de Sicar, Jesus tinha demostrado este gracioso desvio dos interesses pessoais para cuidar dos outros, Ele deu seguimento ao Seu exemplo exortando a seus discípulos para levantarem seus olhos e olharem para os campos. Um olhar egoísta é um olhar para baixo, e como tal, é para ser evitado pelos que desejam endireitar os caminhos dos seus pés. A preocupação de Paulo não era somente com o bem espiritual dos crentes individuais mas com a marcha progressiva da comunhão do povo de Deus, e ele sabia que isto seria comprometido se cada um ficasse preocupado com seus próprios assuntos, mesmo que fosse na esfera das coisas espirituais.
O último destes olhares mal direcionados é talvez o mais comum no caso dos que desejam seguir o Senhor. Muito das Escrituras parece estar preocupado em conseguir com que o povo de Deus pare de olhar para dentro. Talvez não há nada mais calculado para deter o progresso espiritual do que o olhar para dentro. O que estamos procurando? Algo bom em nós mesmos? Nunca encontraremos isso, como Paulo deixa bem claro quando afirma: “Sei que na minha pessoa, isto é, na minha carne, não reside bem algum” (Romanos 7:8). Introspecção é exatamente o oposto da fé, pois procura por alguma evidência da santidade e poder de Deus em nós mesmos, em vez de se regozijar na perfeição do Salvador. Tem uma falsa aparência de humildade e piedade, mas na verdade leva para a auto preocupação, em vez de para a preocupação com Cristo. Precisamos ser sensitivos para que o Espírito Santo possa sempre nos conduzir continuamente para a apropriação do poder purificador do sangue de Cristo, mas nunca devemos nos manter olhando para dentro quando devemos fitar nossos olhos no nosso Substituto e Salvador. Não é uma pessoa sadia mas uma doente a que está sempre sentindo seu próprio pulso e tomando sua própria temperatura. Salvação é saúde; a saúde dos que sabem que a justiça deles está no céu. Fazemos bem em deixar o Senhor nos sondar, mas nós não teremos nada senão problemas se persistirmos em olhar para dentro. Se pensamos que é necessário continuar olhando dentro para evitar cair nas ciladas de Satanás, o salmista nos assegura que o Senhor vigiará nossos pés se nós mantemos nossos olhos Nele: “Os meus olhos estão sempre voltados para o Senhor, pois somente Ele livrará os meus pés da cilada” (Salmo 25:15). Isto é mais um argumento para o olhar para cima.
Está ficando aparente que muita coisa depende de nosso olhar, de modo que não ficamos surpresos de que perto do final da carta aos Hebreus, a qual nos lembra que somos chamados à parceria com Cristo e nos exorta a nos apressar para a plenitude Nele, deve haver esta chamada a olhar fixamente para Jesus, o autor e consumador de nossa fé. É para desviar nosso olhar do que está para trás, do que está em volta, do que está ao alcance da mão e do que é essencialmente egoísta; desviar o olhar de nós mesmos para Jesus. Abraão, o grande homem da fé, aguardava alcançar uma cidade celestial e um país celestial, e assim foi poupado de olhar para trás ou se estabelecer. Muito estava ligado ao olhar sustentável dele. Muitas vezes ele foi tentado a procurar benefícios mais imediatos, algum meio-termo que era menor do que o melhor de Deus, e o Senhor tinha que constantemente chamá-lo para tirar seus olhos das distrações e recompensas da terra para que ele pudesse desviar o olhar para o objetivo essencialmente espiritual e celestial do seu chamado.
A passagem em Provérbios sublinha o íntimo relacionamento entre olhar diretamente para a frente e tendo um caminho de progresso claro e direto. Abraão descobriu que este desviar do olhar das coisas da terra lhe mantinha constantemente em movimento. De tempos a tempos ele poderia ter se estabelecido em satisfação com sua própria posição, mas “ele aguardava alcançar uma cidade”, e foi poupado de estagnação ao manter seus olhos no objetivo prometido de Deus. Uma passagem muito relevante nesta conexão é: “nossas aflições leves e passageiras estão produzindo para nós uma glória incomparável, de valor eterno. Sendo assim, fixamos nossos olhos, não naquilo que se pode enxergar, mas nos elementos que não são vistos; pois os visíveis são temporais, ao passo que os que não se veem são eternos” (2 Corintios 4:17-18). É o eterno que está em vista, e isto exige ajustamento em muitos aspectos de nossos assuntos, para que nossas vidas possam ser direcionadas para a permanente glória do propósito de Deus para nós. Nosso procedimento deveria ter sempre a eternidade em vista. Quando estamos considerando um relacionamento, deveríamos vê-lo à luz do fim de Deus. Se temos que decidir onde viver ou qual trabalho tomar, deveríamos deixar nossos olhos olharem diretamente, não escolhendo o que parece bom só no momento, mas se certificando de que os valores eternos são também considerados. Exatamente como Satanás tentou Cristo ao Lhe oferecer os reinos deste mundo e sua glória, assim ele tentará distrair nossa atenção da vontade de Deus oferecendo aparentes vantagens agora. Sempre seremos salvos pelo olhar para cima.
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